domingo, 1 de maio de 2011

DOMINGO ENSOLARADO

Panorâmica da antiga Pracinha Barão de Ceará-Mirim.


No centro a inesquecível sorveteria de José Bonifácio - demolida pelo ex-prefeito Edgar Varella


O amigo Pedro Simões continua seus ensinamentos... são importantes situações que nos faz refletir a respeito do amor à nossa terra. Suas crônicas despertam um sentimento de pertença que, na maioria das vezes, hibernam e, de repente, são eclodidos em busca de um horizonte "perdido".

Sua crônica "Domingueiras" me fez voltar ao passado e escrever algumas lembranças da infância.

Fonte da crônica:



Crônica de Pedro:

QUE FAZER DESSE SOL DOMINGUEIRO VERANEADO?

DOMINGUEIRAS (01.05.11)
Já acordo no domingo procurando o meu cavalo branco (não o uísque, mas o animal) selado e arreado no terreiro de casa, pra me danar pelos ocos do mundo. Quando estou bem desperto descubro que estou em plena selva de concreto e asfalto, mesmo que algumas árvores dos cant...eiros da rua me remetam para o quintal do casarão de Ceará-Mirim. Fazer o que?
Vou para o meu “aquário”, um mirante que me expõe as ruas próximas e as dunas distantes, e encho os olhos de paisagens e de sonhos.
Um cachorro deposita os seus restos de lixo na calçada, e me lembro que quando criança nós entrelaçávamos os dedos indicadores e num repente, os excrementos do animal não fluíam mais, ficavam como que congelados entre o orifício e o espaço. Até que alguma senhora bondosa, numa zanga bem humorada nos fazia descruzar os dedos. E “plaft”, o sólido era atraído pela gravidade e se espatifava no chão.
A caminho do escritório, um sol veraneado e domingueiro me anima a tirar os óculos para captar de modo natural, sem anteparos, o mundo que me rodeia. É quando descubro um casal(?) de Galos de Campina. São velhos conhecidos. Quase sempre os encontro, no mesmo horário – entre 6 e 6.30 – bicando ciscos no chão.
Por isso tomei a decisão de sair todas as manhãs com a máquina fotográfica e nunca consegui flagrá-los, pois eles fogem tão logo me aproxime. Hoje tomei mais cuidado e fui me esgueirando pelo muro, sorrateiro, caviloso, dissimulado, e consegui chegar a uma distância que julguei suficiente para produzir uma obra de arte.
O sol no meu visor confundiu as imagens. E a minha visão, já cansada de 67 anos de “voyeurismo” existencial, sem os óculos, e com o olho direito aguardando o momento da cirurgia da catarata, completou o registro das dificuldades. Disparei o botão pedindo a Deus um milagre.
(Quando cheguei ao escritório e fui conferir as imagens, descobri que três das fotos esqueceram os pássaros e das três restantes, apenas uma distinguia as duas aves um exercício de adivinha. Estou decido a tratá-las no Photoshop para não admitir a derrota.)
A chave do cadeado escapuliu-me da mão e se projetou entre as grades do portão, caindo entre hibiscos do jardim da entrada. O portão impediu-me de recuperá-las. Pular o muro, nem pensar, com a cerca elétrica em funcionamento. Liguei para casa pedindo a duplicata e alguns minutos depois pude afinal entrar no meu refúgio.
Meu escritório é um caso à parte. É uma pequena construção térrea, composta por três peças: sala de estar/espera, sala de trabalho e banheiro. São apenas 40m² de área construída. Uma verdadeira caixa de Pandorra. Onde deveria ser a sala de espera, é também serventia de livros acondicionados em caixas de papelão e alguns equipamentos da antiga loja de artigos personalizados de minha mulher.
A sala de trabalho comporta a minha mesa de vidro em forma de “L”; três impressoras, um notebook e um computador de três módulos; duas poltronas azuis enormes; uma escrivaninha das antigas, integrante de um conjunto que inclui um divã em madeira e vime; uma mesa de reuniões com quatro cadeiras de vime; frigobar, som, estantes, estantes e estantes, livros, livros e livros.
Uma pequena pinacoteca com reproduções de Portinari (cangaceiros, instrumentistas e meninos caçadores e vendedores de pássaros); imagens de casarões e ruínas de Ceará-Mirim; e diplomas, títulos, medalhas. Um São Francisco de Assis Marinho e muitos gaveteiros.
É aqui que componho as minhas escrituras, reúno os amigos e atendo eventuais clientes.
Sentado diante do computador teclo essa crônica com o pensamento distante, embaralhando o que escrevo. Como estará Ceará-Mirim nesse dia de sol? Onde estaria no Ceará-Mirim o menino descalço, sem camisa, de calças curtas, mundo pequeno, curiosidade enorme, esperanças muitas, sonhos ilimitados?
Não sou lamurioso, nem vivo ancorado no passado. Sou homem contemporâneo, ajustado, tolerante, sem preconceitos. Mas que os domingos de sol veraneados são sumidouros de memórias, isso são...
Vou aguardar mais algum tempo para saborear um velho (Old) e honesto Parr e assuntar com os amigos e a família à beira da piscínica, os muitos ufanos da terra Brasílica, beijada pelo sol e pela brisa que balança a palha dos coqueiros e assanha os cabelos das morenas.
Que cada um reencontre o seu Ceará-Mirim.
Bom domingo.


Não me contive e, felizmente, pude escrever alguns retalhos da lembrança na tentativa de encontrar o meu Ceará-Mirim:

Amigo Pedro,
Menino em Ceará-Mirim, no meu tempo, bem próximo do seu, anos 1970, de pés descalços, estaria, nesse domingo, provavelmente em vários lugares imaginários e reais naquele tempo.
Normalmente, pelas 8 horas, a “fileira” de meninos fazia um cordão barulhento a caminho da residência de Antônio Potengi e Dona Ambrosina, nosso inesquecível Sítio do Pica-pau Amarelo. Nos finais de semana estaríamos jogando bola no campinho de Manoelzinho (do cartório) e seu irmão Carlos Gusmão. Certamente não existiam ali figuras mitológicas encantadas, mas, havia personagens inesquecíveis, atores de constantes batalhas futebolísticas interrompidas pelos xingamentos às mães e trocas de bofetes.
Quando não tinha futebol, como Pedrinho, Emília e Narizinho, brincávamos sobre as árvores ou correndo pelo sítio, e, muitas vezes, ficávamos sobre o “embuzeiro do sertão” pensando nas imaginárias namoradas do Instituto Imaculada Conceição.
Quem sabe, estaríamos, uma “reca” de meninos, brincando de “mãos para o alto” ou guerra de baladeiras cuja munição eram carrapateriras, no sítio da maternidade ou no Seu Antonio Ferreira, chefe da Estação Ferroviária.
Domingo ensolarado, é um dia perfeito para descer ao rio dos homens, rio do balão, brincadeiras de tica-tica no rio, pegar piabas em garrafas cheia de farinha, ou então, aproveitar o sol e sair matando “cobra rainha” com baladeira... Capturar muçuns nas locas do rio e, depois, arriscar um “roubo de cana” nos “partidos” da usina São Francisco, correndo o risco de ser pego pelos vigias.
Muitas são as atividades “traquinas” de nossa meninice, quando o domingo era dia chuvoso, aí sim, a programação era especial, se deitar nas enxurradas que desciam a ladeira do Patu e tirar as enquizilas nas águas que desciam das fortes “bicas” da casa de Seu Ozéias Araújo, famoso enfermeiro de nossa Ceará-Mirim ou então, banhar-se no olheiro, observando o vai-e-vem dos carros pipas que vendiam água na cidade.

Rua São José - hoje Manoel Varela - ao longe, a direita - a mangueira centenária de Dona Celina


Mas, falando de seu casarão na rua São José, (casa de Dr. Pedro Simões – era assim que a chamávamos – no tempo que morou por lá um rapaz chamado Aguiar) morei em frente, pelos idos de 1972, e, quando não havia ninguém na casa, pulávamos o muro, e nos deliciava com os suculentos Cajás, e muitas outras frutas que existiam no quintal. O pé de Cajá, para mim, era o mapa do Rio Grande do Norte, muito frondoso. Não lembro se cortaram a árvore, mas, parece que ainda sobrevive a nossa meninice, como a Mangueira Rosa de Dona Celina...firme e poderosa contando nossa história.
São apenas lembranças... Nossas peraltices infanto-juvenis passaram, mas a memória permanece viva pronta para viagens sentimentais e românticas.


É isso... um bom domingo ensolarado e chuvoso!

Um comentário:

  1. Visitei este Blog, através da Cursista Marianalda Matias Meneses do curso: Tencologias na Educação: Ensinando e Aprendendo com as TIC, ministrado pela Tutora: Maria de Fátima Alves campos na cidade de Tocantinópolis-To.
    Quero parabenizá-los pelo magnífico Blog!

    Fortes abr@os a tds!

    Profª Mª de Fátima A. Campos

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