quinta-feira, 14 de maio de 2020

SALVE MESTRE TIÃO OLEIRO



SALVE MESTRE TIÃO OLEIRO

Em outubro de 2018 o Brasil se despedia de uma grande estrela da cultura popular, o Mestre Tião Oleiro, cuja luta em defesa das tradições de sua terra, o levou ao mais alto reconhecimento quando recebeu as medalhas do Mérito Cultural pelo Governo Federal, Medalha Djalma Maranhão pela Assembleia Legislativa do RN e Medalha Deífilo Gurgel pelo Governo do Estado do RN. Todas as homenagens dentro das comemorações pelo seu centenário em 2014.

Ainda em 2014 solicitei ao presidente da Câmera de vereadores, Renato Martins, que apresentasse projeto tornando 14 de Maio Dia Municipal da Cultura. Renato apresentou o projeto e o então prefeito Peixoto sancionou a Lei.

Conheci o Mestre lá pelos idos de 1999 em um passeio de bicicleta com o amigo Mucio Vicente. Naquela oportunidade Mucio me levou até a residência do velho Griô. Fomos apresentados e marcamos outra visita para que pudéssemos conversar melhor e alongar a prosa por mais tempo.

Foi a partir dessa prosa que iniciamos uma história de vida até o dia de seu encantamento. Foram muitas experiências vividas durante nosso tempo de convivência. Cada encontro com o sábio ancião era uma nova oportunidade de aprendizagem. Foram muitos ensinamentos.

Em 2002, aluno do curso de Arte pela UFRN, fizemos uma atividade para a disciplina de Folclore Brasileiro onde pesquisamos o grupo folclórico Congos de Guerra de Guanabara que era liderado pelo Mestre Tião. Durante a culminância do projeto de pesquisa, o grupo folclórico se apresentou no Teatro do Deart na UFRN. Foi uma apresentação inesquecível. Aquele dia foi o início de nossa luta em defesa da valorização, fortalecimento e preservação dos grupos tradicionais da região de Ceará-Mirim.
Em 2004 quando monitor do PROJETO MOVA BRASIL – alfabetização de Jovens e Adultos, fizemos pesquisas com os alunos sobre a cultura popular de Ceará-Mirim destacando Mestre Tião e seu grupo folclórico Congo de Guerra de Guanabara. O projeto foi classificado para ser apresentado no FÓRUM SOCIAL NORDESTINO em Recife no ano de 2004. O Fórum deu oportunidade para os Mestres Tião Oleiro e Zé Baracho mostrarem todas as suas qualidades e capacidades criativas.
Em 2008 o Canal Futura produziu um documentário chamado “A beleza do meu lugar” que homenageava 16 mestres de cultura popular de todas as regiões do Brasil e o mestre Tião estava entre eles. Esse material é divulgado em todos os países que transmitem as programações do Canal Futura. Dessa forma o mestre ficou conhecido em várias partes do mundo. O documentário concorreu ao 19º prêmio internacional de curtas em São Paulo no ano de 2008

Ainda em 2008 o Projeto Vernáculo, coordenado por Cleidiane Vila Nova, Ianne Maria e Rita Machado, produziu um vídeo sobre o Congo de Guerra de Guanabara onde apresentava a luta dos mestres Tião Oleiro e Zé Baracho pela preservação do grupo. O documentário concorreu ao 9° Prêmio de Curtas Potiguares em 2009.
Em 2009 recebeu o título de Patrimônio Vivo do Rio Grande do Norte através da Lei do Registro do Patrimônio Vivo do RN. O Prêmio concedeu uma bolsa mensal até o final de sua vida.

Apesar de agricultor e foguista de engenho de açúcar, a arte era o alimento da alma do bardo ancião, era mestre de cultura popular, sanfoneiro e cantador de coco. Viajou muito pelo interior tocando seu fole de oito baixos. São muitas histórias que um dia serão contadas.

Ficaram suas lembranças e seus ensinamentos e, o que levarei para sempre, é que nunca deixe de lutar, mesmo que a esperança esteja minada de incertezas, é preciso seguir em frente!!!

Que a arte consiga superar todas as formas de incompreensões tendo como resposta o bom combate, criatividade e muitos questionamentos!!

Textos sobre Mestre Tião:

segunda-feira, 11 de maio de 2020

O MUNICÍPIO DE CEARÁ-MIRIM - PARTE 2


Copiado do Face da ACLA Pedro Simões Neto

Dando continuidade às publicações históricas, a ACLA apresenta o segundo fragmento do livro "MUNICÍPIOS DO RIO GRANDE DO NORTE – CEARÁ-MIRIM", de autoria de Nestor dos Santos Lima.
O MUNICÍPIO DE CEARÁ-MIRIM
Nestor dos Santos Lima
PARTE 2


A 29 de setembro de 1821, o Senado da Câmara de Extremoz jurava as bases da Constituição, sendo presidente o alferes Alexandre da Silva de Andrade, Francisco Xavier Torres e Luiz José da Penha.
Na madrugada de 21 de dezembro desse ano, surgiu um movimento de rebeldia contra o vigário João Ignácio de Britto.
Para diretor da vila dos índios era proposto, em verea-ção de 25 de janeiro de 1822, Manoel Ferreira Nobre.

A proclamação da Independência Nacional, em 1822, foi recebida pelo Senado da Câmara de Extremoz, composto de Pedro Paulo Vieira, João José de Mello e Francisco Xavier de Souza, que prestaram juramento de fidelidade ao Imperador D. Pedro I, de cuja aclamação só tiveram conhecimento oficial, na vereação de 15 de janeiro de 1823.

A 4 de junho de 1825, foi jurada solenemente a Constituição de 25 de março de 1824.
Os índios vilados em “Veados” eram dirigidos por cidadãos indicados ao governo da capitania pelo Senado da Câmara. Foram diretores ali, Hyppolito da Cunha Conceição, em 1822, Manoel Ferreira Nobre, em 1824, José Alves de Carvalho, em 1825, e Clemente Pio de Andrade, em 1832.

Informava, a 7 de setembro de 1839, o presidente D. Manoel de Assis Mascarenhas, à Assembleia Provincial, que “os índios de Extremoz, em número de 700, tinham uma légua de terras na cidade dos Veados, pouco trabalhavam em agricultura, viviam de pesca e de trabalhar a jornal”. (Vide Relatório, 1839).

A primeira escola primária oficial foi instalada em 1832, sob a regência de Antonio Victorino Ferreira Nobre, substituído em 1840, por José Bento da Fonseca.
A primeira Câmara Municipal de Extremoz foi eleita a 1º de junho de 1829 e empossada a 27 do mesmo mês e compunha-se dos cidadãos Manoel Varella do Nascimento, Gonçalo Ferreira da Rocha, Francisco Xavier de Souza, Felippe Varella Santiago, Francisco de Paula Soares da Câmara, Antônio Felix de Carvalho e Francisco Xavier de Carvalho.

O município de Extremoz compreendia, a esse tempo, uma Igreja Matriz, uma capela nos Touros, 5 povoações, 2 escolas particulares, tendo a da vila 12 alunos e a dos Touros 20.
A última sessão da Câmara de Extremoz, antes da mudança, foi a 22 de janeiro de 1857.
A resolução provincial n. 321 de 18 de agosto de 1855 elevou a povoação de “Boca da Mata” à categoria de Vila, com o nome de Ceará-Mirim, e para ai transferiu a sede do município. Outra resolução n. 345 de 4 de setembro de 1856 suspendeu a execução da anterior, mas, finalmente, a de n. 370 de 30 de junho de 1858 mandou efetuar a mudança. Durante 21 meses, não funcionou a Câmara Municipal, de modo que, só a 14 de outubro de 1858, é que se realizou a primeira sessão na nova vila de Ceará-Mirim, sob a presidência de Francisco de Paula Soares da Câmara e sendo vereadores Miguel Germano de Oliveira Sucupira, José de Goes de Vasconcellos Borba, Bento Gervásio Freire do Revorêdo, Padre João Coelho de Souza e Joaquim Romão Seabra de Mello.

Entre outros presidentes da Câmara Municipal, encontrava-se o cel. Luiz Antonio Ferreira Souto, no quatriênio de 1864 a 1867, quando renunciou, por ter mudado residência para Assú.
Em 1882, foi a Câmara Municipal suspensa quando era presidente o dr. Heráclio de Araujo Villar, assumindo a administração municipal o padre Antonio de Oliveira Antunes.

Ao tempo da grande seca de 1877-1879, o governo provincial criou em Extremoz uma colônia de flagelados, denominada “Sinimbú” à margem esquerda do rio “Mudo”, ou “Caratan” contendo 1.200 palhoças para 6.600 habitantes, sob a administração de Arsênio Pimentel e Westremundo Coelho.
Era presidente da província o Dr. Elyseu de Souza Martins.
Mais tarde, porém, em 1878, o vice-presidente Dr. Manoel Januário Bezerra Montenegro extinguiu a colônia “Sinimbú” e mandou arrolar o respectivo material.

O MUNICÍPIO DE CEARÁ-MIRIM - PARTE I



Texto copiado do Face da ACLA Pedro Simões Neto


A ACLA inicia, hoje, uma série sobre as obras literárias clássicas que narram a História da nossa cidade. Com isso, a Casa de Pedro Simões tenta aproximar o passado do presente a todos os ceará-mirinenses. A organização da apresentação dessas obras foi pensada com o fim de possibilitar uma leitura gradual e progressiva, buscando manter a média de 3 páginas.
A ACLA, como guardiã da cultura de Ceará-Mirim, espera contribuir com o sentimento de identidade do nosso povo e deseja a todos uma boa leitura.
Nesta primeira parte da série, apresentaremos o primeiro fragmento da obra "MUNICÍPIOS DO RIO GRANDE DO NORTE – CEARÁ-MIRIM", de autoria de Nestor dos Santos Lima.


O MUNICÍPIO DE CEARÁ-MIRIM
PARTE 1


O território do importante e rico município de Ceará-Mirim, outrora de Extremoz, limita-se ao norte, com o município de Touros, pelo rio Maxaranguape, até a sua barra no Atlântico; a leste, com o oceano e o município de São Gonçalo, desde a barra do rio Guajerú, ou Rio Doce, passando pela lagoa de Extremoz e até a Massaranduba, pelo riacho desse nome; ao sul, com essas divisas de São Gonçalo, e a oeste, com o município de Taipu, segundo a linha estabelecida pela lei estadual n. 422 de 28 de outubro de 1917, que assim dispõe:
“Ao norte, partindo da foz do Riacho Seco, a ponta da Lagoa do Mato, pelo lado de cima; dai, em linha reta, à Passagem das Pedras; dai, à Cruz do Salvador; desta, pela estrada de Macaíba, ou das ‘Boladas’, até o Riacho do Mudo, e por este acima, até a Trempe dos Municípios, no lugar denominado ‘Poço do Juazeiro’.”.

A superfície territorial é de cerca de 2.880 quilômetros quadrados, medindo de norte a sul 48 quilômetros e de leste a oeste 60.

As terras que hoje constituem o município de Ceará-Mirim, foram concedidas a vários donatários, no início da colonização da Capitania.

Jeronymo de Albuquerque, capitão-mor do Rio Grande do Norte, concedeu várias sortes de terras, entre outros, a Affonso Alvares, em 7 de março de 1604, a Braz de Mesquita, em 2 de Junho de 1604, a Manoel de Carvalho, a Gaspar Rabello, a Domingos Álvares, a Jeronimo de Athayde e aos padres da Companhia de Jesus, em 7 de janeiro de 1607, terras essas situadas, ora na Várzea, ora no rio Seará. O capitão-mor Francisco Caldeira Castel Branco também concedeu terras na várzea do Seará, na testada das da Companhia de Jesus, a Beatriz de Paiva, filha do alferes Luiz Gomes, em 4 de outubro de 1613 (Ver. Do Inst. Hist., vol. VIII, págs. 30 a 72).

Quando, no ano de 1614, vieram a Natal o capitão mor de Pernambuco Alexandre de Moura e o desembargador Manoel Pinto da Rocha, afim de executar a provisão regia que mandava repartir e dar de novo as terras concedidas e não cultivadas, encontraram as datas concedidas no rio e na várzea do Seará umas bem aproveitadas e outras absolutamente incultas e devolutas, que eles deram a terceiros.
Segundo refere Ferreira Nobre, na sua “Breve Notícia da Província do Rio Grande do Norte”, 1877, os índios potyguares teriam fundado um estabelecimento junto à lagoa Guajeru, (hoje Extremoz) e os padres jesuítas fundaram um convento, uma bonita Igreja e um prédio com acomodação para a Câmara Municipal e Cadeia.

Não padece dúvida que os jesuítas, tendo obtido uma vasta sesmaria de quatorze léguas, que pegava da gamboa do Jaguaribe, à margem do Potengi, defronte da cidade de Natal, correndo para oeste até emparelhar com a lagoa do Guajerú, três mil braças e dez palmos, em direção ao noroeste seiscentas braças e daí até o “Mar Salgado”, (data 102 do auto de repartição de terras, cit. Ver., pág. 40), embora só tivessem ali, até 27 de fevereiro de 1611, “dois currais de vacas, algumas éguas, e dois escravos da Guiné”, tiveram necessariamente de povoar e aproveitar as ditas terras, onde fundaram o aldeamento de Guajeru, com o convento, a Igreja e mais acessórios.

Mas, tendo o alvará régio de 1755 expulsado do reino de Portugal a Companhia de Jesus, mandou vilar os índios domesticados, concedendo-lhes terras, de uma légua, em quadro, e submetendo-os a uma administração civil.
No desempenho dessa missão, o desembargador Bernardo Coelho da Gama Vasco criou a Vila de Extremoz e a instalou no dia 3 de maio de 1760, desmembrando-a da cidade de Natal, a quem pertencia.

O aldeamento jesuítico, então transformado na Vila de Extremoz, era denominado “Aldeia do Guajeru”, sob a invocação de São Miguel, compunha-se de índios caboclos da língua geral e tapuyos da nação dos Payacús (Ver. Inst. Vol. XI-XIII, pag. 178).

Outras aldeias também se formaram no aludido território doado à Companhia, como sejam a de Potyguassú ou Camarão, em Igapó, e a de Jacaúna, nos terrenos do norte, em Conapolumirim, ou Porto-mirim, como entendia o des. Luiz Fernandes (Ver. Cit., vol. VIII, pag. 102).
A mais próspera das aldeias era a de Guajeru, que se tornou “vila”, em 1760, e tal foi o seu desenvolvimento, que foi considerada “Cidade”. (V. Questão de limites entre Rio Grande do Norte e Ceará, vol. 2, pág. 55).

Os demais núcleos ficaram simples povoados, que ainda são.
O território do antigo município de Extremoz se estendia até ao de Lages, hoje; mas, os moradores dessa povoação, em virtude da Lei n. 10 de 6 de março de 1835, ficaram pertencendo à freguesia de Sant’Anna do Mattos. A área municipal correspondia à da freguesia de Nossa Senhora dos Prazeres e 
São Miguel de Extremoz, (lei n. 264 de 7 de abril de 1852).

Poucos anos depois de criado o município, a vila e a freguesia, isto é, em 1775, Extremoz do Norte compreendia, pelo poente, as terras até Aguamaré, onde dividia com Assu, e pelo lado leste, vinha até os limites de Natal, pelo rio Guajerú. Contava 16 fazendas, 484 fogos, e 1.123 pessoas de desobriga, sendo caboclos da língua geral 194 fogos e 194 pessoas e portugueses 208 fogos e 1.097 pessoas. (A República, de 1892, num. 159).

Erigida a vila de Extremoz e instalado o Senado da Câmara, segundo o livro mais antigo, aberto a 27 de julho de 1776, foi o município dirigido por José Gomes de Mello, como presidente do Senado, Francisco José de Amorim, como juiz ordinário, e Antônio dos Santos Vila Nova, como vereador mais velho. Depois de várias administrações locais, em que figuram os ancestrais das mais distintas famílias do município, entre as quais o sargento-mor Domingos Gomes Maciel, Alexandre Pereira de Britto, José Fernandes Carrilho, Manoel Rodrigues Braga da Luz, sargento-mor Ignácio Duarte, comandante Pedro Paulo Vieira, como juízes presidente e vereadores, eis que em 1828, foi extinto o Senado da Câmara, substituído pela Câmara Municipal, que foi instalada a 27 de julho de 1829, sob a presidência de Manoel Varella do Nascimento, que se conservou por dois quatriênios, de 1829 a 1832 e de 1837 a 1840, José Francisco Xavier da Silva, de 1833 a 1836, Joaquim José Pinto, de 1841 a 1844 e de 1845 a 1848, Manoel Teixeira da Silva, de 1849 a 1852, padre Cândido José Coelho, de 1852 a 1856, e Francisco de Paula Soares da Câmara, eleito para o quadriênio de 1857 a 1860, quando ocorreu a mudança da sede da vila e município para o lugar “Boca da Mata”, que é hoje a bela cidade de Ceará-Mirim.

A VEZ DA BARONESA DE CEARÁ-MIRIM


Texto copiado do face da ACLA Pedro Simões Neto

A VEZ DA BARONESA DE CEARÁ-MIRIM
André Felipe Pignataro Furtado de Mendonça e Menezes
Presidente da ACLA


Com a morte do Barão de Ceará-Mirim (Manoel Varella do Nascimento), em 01.03.1881, era chegada a vez de sua esposa, Bernarda Varella, a Baronesa, assumir, aos 59 anos, os negócios da família e o protagonismo da elite aristocrática de Ceará-Mirim. Tal situação, diga-se de passagem, era de raríssima exceção no modelo de sociedade patriarcal vigente. Tanto é, que no famoso Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro, de Eduardo Von Laemmert, pouco se vê mulheres como proprietárias de engenhos ou fazendas. Ao que tudo indica, a Baronesa era uma mulher de forte personalidade e muito respeitada, daí porque não se pode afirmar que sua posição, como chefe da família Varella, foi, simplesmente, por carregar o título nobiliárquico do seu falecido marido.

Seu nome de batismo é Bernarda Dantas da Silveira, mesmo nome de sua avó materna e, também, de uma tia. Nasceu em 17.06.1821, provavelmente no reduto de seu pai, Capela, em Ceará-Mirim, mas que, à época, tinha em Extremoz a sede municipal. Os pais da Baronesa foram Francisco Teixeira de Araújo, filho do português José Teixeira da Silva e de Teresa Duarte de Jesus, e Isabel Duarte Xavier, filha de Francisco Xavier de Sousa Jr. e de Bernarda Dantas da Silveira – mesmo nome da neta.

Sua ascendência, de acordo com o manuscrito de Manoel Maurício Correia de Sousa, primo da Baronesa, datado de 08.08.1840, cuja transcrição está publicada na Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, edição nº 96 (2018), de que tive o privilégio de ser coautor, ao lado do respeitado genealogista João Felipe da Trindade, vai até os Santos Mártires de Uruaçu.

Também eram primos da Baronesa dois dos meus tetravós, José Dantas Correia e Maria Cândida de Sousa Sobral (casados entre si). A Baronesa e seus primos são, pois, hexanetos de Estevão Machado de Miranda e heptanetos de Antônio Vilella Cid, ambos Santos Mártires, vítimas, em 03.10.1645, do morticínio ocorrido em Uruaçu.

O baronato de Bernarda Varella durou 16 anos: de julho de 1874 a julho de 1890, quando morreu. Desse período, foram 6 anos e sete meses como esposa do Barão, e, depois de viúva, foi Baronesa de fato por mais 9 anos e cinco meses. Foi de fato, e não, de direito, haja vista que o título nobre foi concedido ao seu marido, sendo que os títulos não se transmitiam para os cônjuges. Um bom exemplo disso é que no Almanak Laemmert de 1885, isto é, onze anos após a morte do Barão de Ceará-Mirim, era o nome de Manoel Varella do Nascimento, e só dele, que constava no rol dos nobres do Império.

O certo é que, seja por tradição, seja pela imponência de sua figura, aliado, ainda, a uma necessidade de Ceará-Mirim se sentir parte da nobreza, Dona Bernarda continuou ostentando o título.

Na sua trajetória, ela esteve sempre acompanhada pelos filhos mais influentes, José Félix da Silveira Varella, coronel da Guarda Nacional e proprietário do Engenho Ilha Bela, e Alexandre Varella do Nascimento (Xandu), os quais já acompanhavam o pai, no final de sua vida. O outro filho, Carlos Varella do Nascimento (Carrinho), era doente, não casou nem teve filhos. As filhas estavam muito bem casadas: Ana contraiu núpcias com o Dr. José Ignácio Fernandes Barros, juiz de direito de Ceará-Mirim, ao passo que Izabel casou-se com o Dr. Vicente Ignácio Pereira, médico, político e proprietário do exuberante Engenho Guaporé.

Pois bem. Em 15.08.1882, houve a famosa visita do bispo de Olinda a Ceará-Mirim, muito bem relatada em “Visita Episcopal do Exmo. e Revmo. Sr. D. José Pereira da Silva Barros a algumas paróquias do Rio Grande do Norte”, do Dr. Luís Carlos Lins Wanderley, primeiro médico potiguar, e que, à época, era deputado provincial, tendo acompanhado D. José a Ceará-Mirim. Não tive acesso à referida obra, mas, na parte que trata de Ceará-Mirim, socorro-me de Magdalena Antunes, cuja transcrição está no seu livro Oiteiro: Memórias de uma Sinhá-Moça (1958).

O Dr. Wanderley dá a exata medida de que tudo em Ceará-Mirim girava ao redor da família Varella. O bispo de Olinda adentrou em Ceará-Mirim na luxuosa carruagem de Xandu Varella, que era do tipo caleça (ou caleche), importada da Europa. As carruagens desse tipo eram destinadas a passeios, tinham quatro rodas e puxadas por quatro cavalos. Eram cobertas, possuíam portas e janelas e contavam com dois assentos duplos, um de frente ao outro. O cocheiro responsável por conduzir D. José, foi Antônio Gangorra, escravo de muita estima de Xandu.

Na cidade, D. José foi recepcionado pelos genros da Baronesa, o Dr. Vicente Pereira e o Dr. Fernandes Barros, cabendo a este último ser o anfitrião do bispo, no seu palacete (onde funcionou o Ginásio Santa Águeda), com direito a um grandioso banquete. O Guaporé, do Dr. Vicente Pereira, também acolheu o bispo, sendo oferecido outro banquete. Com a palavra, D. José ofereceu três brindes: o primeiro à majestade da família, representado pela Baronesa; o segundo à majestade do Estado, o Imperador; e o terceiro à majestade da Igreja, o Papa Leão XIII.

Mas a Baronesa não se ocupava apenas de solenidades pomposas. A educação era, para ela, assunto do mais elevado relevo, assim como foi para o Barão, cujo título decorreu por causa da doação de cinco contos de réis para a construção de uma escola em Ceará-Mirim. O jornal Gazeta de Notícias, do Rio de Janeiro, do dia 03.09.1887, noticiou que a Baronesa, então com 66 anos, mandou distribuir para as crianças pobres das escolas municipais da Corte, 100 exemplares da Encyclopedia Popular, de Dias da Silva Junior. Na mesma ocasião, o Barão de São Geraldo (MG) mandou distribuir 50 exemplares – a metade – da referida obra. Diante desse cenário, cabe um questionamento: quem influenciou quem? O Barão ou a Baronesa?

O intrigante disso tudo, é que apenas um filho do casal de nobres buscou se instruir, qual seja, Manoel Varella do Nascimento Junior, ao estudar na Faculdade de Direito do Recife. Por ironia do destino, morreu no quinto e último ano do curso, sem voltar à Ceará-Mirim como doutor. Os outros filhos, como assevera Câmara Cascudo, “(...) foram senhores de engenhos. Nenhum funcionário público. Nenhum emigrou”.

E, aos poucos, a Baronesa foi conseguindo suprir a lacuna da liderança, deixada com a morte do Barão, passando a ser, ela, com o poder da sua nobreza, a nova referência de Ceará-Mirim.