DE AMOR SEM NOME
Lamparina na janela, cumprindo sinal.
Foi chegando, avistando e se
apeando. Ali mesmo, cuidou de amarrar a montaria, escondida nos velames da
cerca. De moita em moita, foi tomando chegada no oitão. Cachorrada dormindo com
chá de liamba. Tudinho correndo nos bons conformes. Pôs-se detrás do pau d’arco,
a dez braças da casa. (...)
Tudo começado por simpatiazinha
calada que – mais por arte dela – foi virando namoro escondido. Coisa de longe,
embora apaixonada, no modo antigo de sorrir piscos e acenos. Moça presa e
vigiada em casa de inimigo, quase nem dando pra trocar suspiro, quem dirá,
palavra. E naquilo também se regalava de enganar o sabichão do
bicho-de-lama!...
(...) Arremedou a mãe-da-lua,
escritozinho. Nenhuma resposta. Assobiou de novo. Nada ainda. Na terceira, a
luz mexeu-se em cruz, depois se apagou. Tudo certinho no combinado. Era agora
ou nunca mais!...
Com pouco, pisadas chegando no
piçarro do terreiro. Ao seu ouvir, faziam todo o barulho do mundo!... Vultinho
formoso dela, trajada de homem, cabelo arrumado em cocó. Moça corajuda, aquela;
danada de esperta, disposta no gostar!... No arrocho do abraço, sentiu-lhe o
coração desembestado. Mesmo no aperreio da hora, apreciou aquilo, agradecido de
tamanha benquerença.
Não dera para arranjar cavalo.
Nisso contrariou-se, mas nem quis aclaração. Desistir, fativo que podia; mas
ela, de ansiosa, não querendo... Roxim, seu burro, mulo acavalado, era de força
e confiança. Sendo ela pequenina...
(...) Informa qual a feição de
cara e tope de corpo? Gente conhecida daqui mesmo? Precisando de remediado?
Vizinho de divisa quase sempre se inimiza... Alguma razão sabida ou porém
segredoso?
Mas qual bisbilhotar, seu coronel!?...Qualquer
coisa informada que seja de ajuda, fica sendo da minha inteira conta...Se
malpergunto é pelo ofício de rastreador. Pois sabendo donde veio, melhor
calculo adonde vai. Como bem, sendo daqui, nascido e criado, conhecedor de
atalhos e esgalhos, fica mais dificultoso...
(...) Não se arrelie, que a gente
já-já embisaca a parelhinha fujona. Tomara que antes do malcometido. Rastear é
arte meio ronceira, mas bem afiançada. Rasto bem seguido finda sempre no
fugido. Mas, além de olho e tino, carece de paciência. Teje calmo, pois que,
hora dessas, aperreio nunca ajuda.
(...) Taí o pouso! Foi de quando
fizeram padarada, no pino do meio-dia; sombreando fresca nesta beira de riacho.
Ali se apearam... Acolá aguaram a montaria... Depois se chagaram praqui. Nesse
canto, estiveram bem de frente-a-frente...semelha que foi abraço... Espie,
somente as pontinhas dos pezinhos dela, aqui entre os dele; salto da bota mais
bem firmado. Pelo visto. Quem atracou foi ela!!...
Tá certo coronel, desculpe! Se
faz tanta questão, prometo não mais destrinchar revelações de certas miudezas.
Deixe ver...Daqui, foram prali... Vige, danou-se! Espie bem daqui, debaixo
dessa moita... Ai, ai-ai, que se afigura em desgraça feita, coronelzinho! Ah,
foi que foi!... Ficou tudo escrevinhado aqui na arei. Repare que são de machos
estas marcas afundadas. Cá estão as duas baixas dos joelhos e as cavas dos
cotovelos. Sinais mais rasos são de mulher. Dá bem pra ver o ciscado de
calcanhares, o espojeiro dos quartos e até o varrido do cocó!...
Horinha do sol posto, morcegos
doidejando, deram com eles, nas capoeiras profundas. Quase chegados na divisa
do Paraíso; gemendo sem dor, debaixo doutra moita. Indo longe...
E haja-pau cantou redobrado (...)
O final??
Lendo o livro LUGAR DE ESTÓRIAS
de Bartolomeu Correia de Melo
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