quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

LAVADEIRAS

Texto do facebook - Perfil da autora Gracinha Barbalho B. Teixeira
LAVADEIRAS
Houve uma determinada época em que a roupa suja, no bom sentido, era lavada fora de casa, melhor explicando, em rios e lagoas das cidades. Um dos locais mais procurados por essas trabalhadoras era o rio Ceará-Mirim, comumente chamado de Rio dos Homens, assim como as localidades de Capela, Maceió, Gravatá, Primavera e Lagoa Grande.
Era na segunda-feira que Dona Guiomar vinha pegar a roupa que minha mãe arrumava numa grande trouxa, incluindo duas barras de sabão Vencedor e dois tabletes de Anil Imperial. Ela chegava bem cedinho, tomava café, depois colocava a roupa na cabeça e descia ladeira abaixo até chegar ao seu destino, o rio ou lagoa onde de cócoras ensaboava e esfregava, colocando depois ao sol, em cima dos matos para quarar; depois de certo tempo recolhia, fazendo sempre o mesmo ritual: esfregava mais uma vez, lavava, enxaguava, colocava a água de anil na roupa branca e depois estendia ao sol. 


Olheiro Pedro II localizado por trás da estação de trem (demolido em 2017)
Nesse ínterim, caso tivesse levado, comia alguma coisa, e esperava que a roupa secasse, recolhendo-a, arrumando-a e fazendo uma nova trouxa limpa e cheirosa. Essas atividades duravam de dois a três dias, caso não chovesse. Quando a roupa já lavada chegava, minha mãe separava a que ia ser posta na goma e depois encaminhava para a casa de Águeda, a melhor engomadeira de Ceará-Mirim, diga-se, das pessoas que moravam lá em cima, na Rua do Patú; o restante se passava em casa mesmo com o “bendito” ferro movido a brasas, abanadas e assopros.
Creio que todas nós dessa geração presenciamos esses fatos e esse tipo de profissão tão árdua e cansativa. Além de dona Guiomar, também tivemos outra lavadeira, dona Zefinha, mãe de Neide e Dorinha. Ela também tinha um bebezinho, uma menina, que, muitas vezes, deixava lá em casa quando levava as duas maiores para poder lavar a roupa. Vida dura e sofrida dessas criaturas, muitas vezes maltratadas e humilhadas quando a roupa não chegava tão limpa como queria a “patroa”. A essas santas criaturas, o meu louvor, a minha gratidão e o meu respeito por tudo que tiveram que suportar de pessoas arrogantes que se achavam melhores que elas.
Coitadas dessas arrogantes, muitos anos depois vi as referidas patroas, lavando sua própria roupa. Seus tempos de bonança, para o uso de suas soberbas e luxo, não mais existiam. Assim é a vida, dia estamos muito bem, outros estamos à deriva. Quase nunca aprendemos as lições que a vida nos dá. Benditas sejam as lavadeiras de Ceará-Mirim, do passado e do presente, e de tantos outros lugares comuns.


Fonte: 
https://www.facebook.com/maria.barbalhob.teixeira?hc_ref=ARTfyXJ-d3C9YcRSPQ85zF1Pe-  PhXWxM_Hh9Hsn_WJHHMgjsLd9md9oQNLoEU3WU_P0&fref=nf&pnref=story

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